segunda-feira, 11 de junho de 2012

Mérito? pra que? por Leandro Prazeres

Mérito? Pra quê?

Acordo relativamente tarde depois de um final de semana de plantão (como diria meu irmão ironicamente: salvando vidas) e me deparo com duas notícias que me chamam atenção e me fazem refletir sobre conceitos como absurdo, nojo e fuga.

A primeira foi a decisão do desembargador Domingos Chalub que concedeu liminar favorável ao grupo conhecido como Quinteto Fantástico e que, em síntese, anulou a decisão do governador de "desnomear" os cinco que foram nomeados como delegados mesmo tendo tido notas muito abaixo da média no concurso para delegado.

Sobre esse caso específico, eu tenho muito pouco a dizer além do que já escrevi em uma série de reportagens recentemente. Mas admito que esse episódio me fez pensar sobre se vale a pena. Vale a pena se expor, vale a pena trabalhar duro, fazer o seu trabalho com dignidade e diligência, jogar na cara da sociedade toda essa permissividade se um senhor de toga, supostamente ungido dos melhores votos, vai lá e numa canetada coloca candidatos que, segundo o próprio concurso, não tinha a menor condição de assumirem o cargo?

Não se trata aqui de um lamento do tipo "roubaram minha bola e agora eu vou chorar". Longe disso. É um lamento maior e mais profundo, mas isento de choro. Porque minha vida não depende desses delegados. Não dependo do Chalub. Em última análise, não tenho nada contra nenhum destes senhores e minha vida pode e deverá seguir, salvo algum sobressalto, sem jamais esbarrar com as deles de novo. Não fosse quem eu sou e no que eu acredito, eu não teria o menor motivo para me importar, mas me importo. Porque esses senhores e senhoras não farão mal a mim (espero) diretamente. Nunca tive com nenhm deles, exceto com Thomaz Vasconcellos, relação alguma. E minha relação com Thomaz sempre foi a de repórter e fonte. Mas a quebra de regras que a permanência deles nos cargos representa é muito mais danosa para a sociedade como um todo que para mim, já que nem concurso público eu penso em fazer no curto prazo. E uma vez que não pretendo, ao menos no curto prazo e médio prazos, me envolver em nada ilícito.

Mas a questão aqui é: quem se importa? E ela me leva para a segunda notícia que me chamou atenção durante o dia. Um grupo de moradores da Travessa Artur Bernardes ameaçou fazer um protesto porque a Amazonas Energia estava retirando os gatos que abasteciam a pequena "favela" da área. O conselheiro da área disse que havia tentado regularizar a energia no local e que a retirada da eletricidade "a gato" era um desrespeito. Ameaçaram fechar a avenida Constantino Nery, o que não ocorreu apenas porque a PM chegou a tempo.

Essa notícia me tocou mais, eu admito, que a canetada do Chalub. Me tocou porque ela sintetiza a alma de um povo. E não é a alma do manauara tão somente, mas a alma do brasileiro. Apenas um povo completamente sem a menor noção do que é cidadania, sem a menor noção do que é respeito ao próximo, sem a menor vergonha na cara, seria capaz de se indignar quando alguém lhe viesse tomar o produto de um roubo. É o mesmo que um bandido fizesse um protesto depois que a polícia lhe tomasse a TV de LCD que ele roubou do seu vizinho do lado e ainda dissesse que por seis anos, ele tentou conseguir uma TV na loja, mas como ninguém lhe deu a TV, ele foi lá e roubou.

Sinceramente, não me incomoda o gato. Lá em casa, quase nunca falta energia elétrica. Mas me incomoda a cara de pau, a completa falta de vergonha na cara de um povo que tem a audácia de reclamar de uma ação devida. E aí, um pensamento ainda mais amedrontador me veio à cabeça: um povo que protesta quando tentam impedir um roubo jamais vai se levantar quando alguém lhe rouba um direito.

A canetada do Chalub vai repercutir aqui e ali, mas ninguém vai fechar a Constantino Nery por causa disso. E ao se darem conta de que as coisas vão se proceder assim, o Quinteto saberá que venceu e ficará provado que eles eram sim, ainda mais "Fantásticos" do que imaginávamos. Ninguém vai entender que esta é, também, a usurpação de um direito e um princípio fundamental da nossa tosca democracia: o mérito. E uma nação ou um povo que não acredita no mérito, nunca terá o mérito de ser chamada de nação.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

comente...