domingo, 22 de julho de 2012

Não, não é mentira.

Sobre Carlos Portta

Gritos por socorro em várias zonas da cidade pedem, imploram, suplicam, por algo que é tão vital para qualquer cidadão quanto água, transporte, honestidade e caráter. Um personagem tem o poder de manipular ideias, de despertar esperanças, de criar no imaginário popular a falsa sensação de realidade que nem sempre a própria realidade é capaz de criar, nesse quesito, personagem, um, em especial, chamou a atenção.

"Carlos Portta", a máscara que esconde Renê Zafer, um advogado de 41 anos que se acha sério de mais para ser jornalista, ou advogado, é um personagem singular e precioso da política amazonense que até hoje eu nunca havia visto similar, e o nome desse personagem é sátira. Sátira, sim, é algo tão importante para a política quanto cultura para a sociedade. Através da sátira revelamos ideias, descontentamentos, paixões, e despertamos riso, despertamos o cômico, a essência de tudo que nos cerca.

Reproduzo abaixo um trecho da entrevista de Renê, quer dizer, Carlos Portta, para a TV Acrítica.

Mais de um ano após a criação da personagem Carlos Portta, como você avalia a reação do público?



Hoje o que me assusta é perceber que muita gente acredita que o Portta é real, é candidato e, o pior, que fará o que promete. Outro dia, cheguei à rádio e havia três pessoas esperando para falar com o Portta. Eles não me reconheceram, mas explicaram que eram da comunidade Sharp (na Zona Leste de Manaus), que sempre ouviam o programa e, como gostavam muito das propostas, queriam fechar apoio à candidatura dele.


E como você reagiu?


Disse que era produtor e que não adiantava aguardarem porque o Portta chega de helicóptero, por trás do prédio. Fiquei com receio de revelar que ele não é de verdade. Preferi deixar na imaginação deles.


Essa confusão entre ficção e realidade é comum?


Sim. O pai de um amigo meu é advogado aposentado e mandou avisar que fará campanha contra mim por causa do “projeto” de levar o Teatro Amazonas para Iranduba. Essa “proposta” surgiu da constatação de que, apesar da ponte, ninguém vai para o outro lado, pois não há atrativos. Meu amigo tentou explicar que é brincadeira, mas o pai dele disse: “O Tiririca foi eleito! Se esse cara for também, vai querer levar o teatro para lá... Hoje em dia tudo é possível!”.


Não há uma forma de deixar claro que é brincadeira?


Quando faço uma piada, não tem como ficar avisando que é piada. O slogan foi pensado para deixar claro que é tudo brincadeira: “Utopia não é defeito, Carlos Portta para prefeito!” Mas muita gente não sabe nem o que é utopia. Outro dia, um ouvinte de São Gabriel da Cachoeira ligou para a rádio reclamando do isolamento da cidade. Falei que construiria um viaduto, com ciclovia, de Manaus até lá. O cara agradeceu e desligou. Tenho certeza de que acreditou no que falei!


De onde vêm as ideias?


O pessoal da internet colabora muito. Mas as ideias iniciais e as que sustentam o stand up são minhas. Em geral a piada é em cima de um fato político. Essa, de levar o teatro para Iranduba, criei quando o Gilberto Mestrinho afirmou que a ponte ligaria o nada a coisa nenhuma. Agora está tendo a reforma da Ponta Negra, gastaram milhões para fazer uma praia, mas não ficou bonito. Então o Portta “sugeriu” trazer o encontro das águas para lá. Duas atrações no mesmo local.


Você testa as piadas antes de apresentá-las ao público?


Testo na rádio e no palco. Estamos no quinto stand up. O que dá certo a gente mantém. Não acho que dê para testar antes disso.
Ah, você podia contar primeiro para o pai, a esposa... 
Minha esposa tem um humor meio diferente, ri de filmes que não acho graça nenhuma. Gosto de testar no palco: a reação de 600 ou 700 pessoas ao mesmo tempo é definitiva. Quando eles riem, a piada fica no espetáculo.


Quando você percebeu que contar piada seria profissão?


Sempre gostei de inventar estória, mas fui fazer curso para atores por curiosidade. Sou corretor de imóveis também, e tinha conseguido uma boa grana, que resolvi investir nisso. Nunca planejei. As coisas foram acontecendo e estou contente.


É fácil fazer piada com política no Brasil?


Eles fornecem muito material! E o fato de eu ter um personagem ajuda, porque posso criar a partir desses atos e falas. Recentemente, recebemos na rádio o Serafim (Corrêa, candidato a prefeito). Ele falou que, se eleito, distribuirá computadores na rede municipal. Na mesma hora o Portta retrucou: “Darei, além disso, iPad e iPhone. E para estudantes da rede pública e privada”.


O Portta é rápido no gatilho...


Leio as notícias sempre procurando o inusitado. Nas três vezes que gravei com o governador (Omar Aziz), por exemplo, falamos sobre o “projeto” complementar ao Ronda nos Bairros: o Yamaha nos Bairros. E às vezes a piada vem pronta. Ano passado o Carijó (Luiz Alberto, vereador) propôs um minuto de silêncio para a Amy Winehouse.


Tá brincando! 


Pois é... Esse ano gravamos lá e pedimos que ele explicasse a homenagem e repetisse o minuto de silêncio (risos). Há também coisas que surgem na hora. Nessa ida à Câmara, notei vários vereadores gordinhos. Daí criei o Bolsa Regime: na gestão Portta, só manterá o mandato quem estiver na média do IMC (relação entre peso e altura). A brincadeira sempre tem uma crítica.
Existe uma linha tênue entre a piada e a ofensa. Você se preocupa com essa questão? Sempre. E acho que tem dado certo. Os políticos gostam do trabalho, elogiam a linha do programa, que não coloca contra a parede ou tenta humilhar. O CQC está proibido de gravar no Senado. As pessoas fogem. Não quero isso. Quero que parem para falar com o Portta. Claro que a personagem não foi pensada para agradar, pelo contrário. Mas a crítica vem sempre no que se pode fazer de “melhor”.


Você é filiado a partido? Cogita ser candidato? 


Não sou filiado. Nunca fiz política estudantil nem me identifiquei com um partido em especial. Já recebi muitos convites para sair candidato, mas não penso em fazer isso de jeito nenhum. Não quero deixar de ser pedra para virar vidraça.


E o Carlos Portta, o que pode esperar do futuro?


Minha ideia é gerar conteúdo para emissora nacional. O CQC e o Pânico estão na Band, então tenho chance de emplacar na Record. Viajei, tive algumas conversas. Tomara que dê certo. E como o Porta não mente, ele já informou que o plano é ficar dois anos na prefeitura, dois como governador do AM e então se preparar para disputar a presidência da República.


O showmício de domingo é o ponta pé da campanha? 


Vamos trazer de volta para os eleitores a alegria da distribuição de camisetas, cestas-básicas, combustível. O pessoal está proibido de fazer, mas o Portta pode. Serão 40 minutos de “discurso”, um show e encerramento com “brindes”.


Como foi a escolha do artista convidado? 


Ah! O Nícolas Jr. foi escolhido em detrimento de Ivete Sangalo, Cláudia Leitte e U2, que até se ofereceram para fazer o show do Portta (risos). Mas ele optou por um artista local, que é do povo que ele ama e de quem, este ano, será o prefeito.


Nova Personagem


Uma nova personagem do “clã” Portta, desta vez interpretado pelo próprio Renê Zafer, será apresentada ao público em agosto. Além da esposa e do filho, que hoje já participam de algumas aparições de Carlos, ele terá também a companhia do irmão gêmeo, José Carlos.
“O Zeca mora há 24 anos em Pelotas (RS), mas virá a Manaus para ajudar na campanha porque o público gay é um público em expansão”, conta Renê, que não tem medo da polêmica.
A personagem, justifica ele, é uma homenagem aos homossexuais: fala manso, usa óculos escuro dourado, echarpe e tem o bigode fino. O bigode, aliás, está na gênese da personagem Carlos Portta.
Renê decidiu transformar piada em profissão após fazer o curso de atores de Wolf Maia, em São Paulo, e ouvir do diretor Luís D‘Moh o conselho: crie algo engraçado e completamente diferente de você.
“Todas as esquetes que eu fazia, mesmo as dramáticas, sempre colocava uma brincadeira e as pessoas riam. No fim do curso, a ‘semente’ do Carlos Portta tinha sido plantada na minha cabeça”, explica Renê.
O destino deu uma mãozinha durante um passeio pela rua 25 de Março, ainda na capital paulista. Foi lá que Renê deparou-se com o agora famoso bigode e criou o visual da personagem. Faltava só personalidade e nome: “Logo surgiu a ideia de um apresentador candidato, que estivesse sempre soltando os cachorros, mas fosse amável com o eleitorado. A diferença é que o seria um político extremamente sincero”.
O nome veio dias depois, também meio “sem querer”.
“Decidi que usaria meu primeiro nome, Carlos, que quase ninguém conhece. Faltava o sobrenome. Queria algo simples, que qualquer um pudesse falar. Estava pensando nisso quando um vento bateu a porta de casa. Deu um estalo: Portta”, lembra.


Perfil


Renê Zafer, 31 
Formação: Formado em Direito, iniciou Jornalismo mas desistiu porque era “sério demais” (sonho era atuar com entretenimento) 
Experiência: Apresentou por dois anos o programa ‘Sabores da Amazônia’, trabalhou um ano no ‘De Salto Alto’, integrou a equipe da Tessa Mídia que produziu a campanha de Luiz Navarro ao Governo em 2010.

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